“Os Retirantes”, de Candido
Portinari, é como o retrato subcutâneo do homem nordestino brasileiro. É sob a
pele que mora a fome. É a pele magra que revela ossos, músculos frágeis e a
aproximação da morte. A obra dramática e
impactante, que expressa o interesse do artista neste fenômeno social que é o
êxodo da população rural, carrega em si a universalidade do problema que também
atinge outros povos de diferentes lugares.
As perguntas que a obra “Os
Retirantes” pode fazer hoje são: “com que pele os filhos e netos dos
nordestinos fazem hoje o movimento de retorno à terra natal?”, “quem
sobreviveu?”, “qual a intensidade da fome?”. A imagem do quadro tem essa
capacidade de ir além de um registro histórico e social, de transcender a
própria função de uma apreciação estética. É fala viva e persistente, que não
deixa esquecer o passado miserável dos retirantes e não pára de perguntar pelo
futuro dos brasileiros.
Pai, mãe, seis filhos? Pai, mãe, cinco
filhos? – neste caso quem seria a moça que aparece um pouco deslocada do grupo?
A primogênita e mãe solteira? Quem sabe a família possa ter somente quatro
filhos e a jovem talvez seja a viúva de algum Severino, uma agregada. Imaginar
quem são os personagens que aparecem no quadro e suas relações familiares acaba
se tornando um exercício de criação de roteiros de vidas. Secas, com certeza.
O olhar morto do velho tem no quadro um
grande contraste: os pequenos e espertos
olhos da criança de colo. Olhar que reina no centro da obra como a incitar um
pouco de esperança ou a expressar a inocência de quem nunca se lembrará dos
urubus sobrevoando. É o olhar de quem enfrenta a morte sem conhecer o perigo.
Com
este quadro Candido Portinari concilia a arte figurativa com as influências
cubistas e surrealistas. As cores cinzentas e o jogo de luz e sombra criam a
profundidade o ambiente vasto do sertão. O resultado é crônica imagética do
Nordeste brasileiro.
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