domingo, 27 de maio de 2012

Wim Wenders leva para o cinema vigor de Pina Bausch





Primavera, verão, outono, inverno. É fazendo referência às quatro estações do ano que uma bailarina aparece no início do documentário “Pina”, do cineasta alemão Wim Wenders. Ele faz uma homenagem póstuma à coreógrafa Pina Bausch, artista que criou espetáculos de teatro-dança, sempre numa criação colaborativa com seus bailarinos, rompendo barreiras da dança clássica. Ao fazer referência às quatro estações, fica explícita a ideia de que a dança atravessa o tempo, o espaço, o corpo.

Durante todo o documentário, que valoriza muito mais a expressão das coreografias do que informações sobre a vida da coreógrafa, bailarinos sorridentes caminham em fila indiana, executando movimentos repetidamente com os braços. Primavera, verão, outono, inverno. Insistentemente, repetidamente fazem outras aparições no filme. Cruzam o palco, passam por ruas movimentadas e atravessam paisagens naturais. A imagem parece ser a metáfora ideal para afirmar o trabalho contínuo e a necessidade de dançar, mesmo nos momentos de maior adversidade.

Pina Bausch, mulher de poucas palavras, via na dança o potencial de preencher com movimentos o silêncio deixado pelas palavras não ditas. Mas diante da necessidade de se expressar verbalmente, palavras selecionadas e certeiras foram usadas para orientar os bailarinos. Alguns dos artistas relatam isto no documentário. Em quase 20 anos de convivência, a bailarina Ruth Amarante ouviu da coreógrafa um único conselho: “enlouquecer mais”. Para a tímida Ditta Miranda Jasifi, que durante as avaliações sobre os ensaios das coreografias se mantinha sempre discreta, uma pergunta de Pina - em tom de tristeza na voz – soou marcante: “Ditta, porque você tem medo de mim?”. Para um jovem bailarino que se sentia confuso diante da vida ela disse “dance por amor”. Para todos nós ela diz: “dancem, dancem ou estaremos perdidos”. Escrevo assim, “diz” – no presente -, porque a força da expressão parece ecoa agora. O  movimento diz tudo.

O que se vê nas coreografias é a força do desejo, tema recorrente na criação de Pina. Com movimentos precisos, o corpo reage ora com vigor, ora com languidez. Nada é feito gratuitamente. Há dosagem de energia, de força. A intensidade existe de acordo com a situação dramática que envolve o bailarino. E esta situação dramática consegue se definir em cena envolvendo o conjunto (artista, ideia, público), formando um corpo só.

A maior virtude do documentário de Wim Wenders é conseguir envolver o público no ambiente cênico de Pina Bausch, possibilitando olhar de perto os olhos dos bailarinos, os detalhes do corpo, do movimento, do suor. Os detalhes exibidos compensam o fato de não estarmos diante de um espetáculo vivo, mas somente de um registro audiovisual. O diretor consegue recortar trechos de espetáculos históricos da arte contemporânea e assim falar quem é Pina Bausch.

E “quem é Pina Bausch?” é uma pergunta que não exige resposta precisa, já que a própria coreógrafa acreditava que o importante era seguir buscando, mesmo sem saber exatamente o que buscar ou para onde ir. Importante é ser de verdade, viver de verdade e seguir. Primavera, verão, outono, inverno.  



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